PEC 65: ENTENDA A PROPOSTA

21:55:00 Grupo PET-Intervenção Socioambiental em Uruçuí-Una 0 Comments Category :

Em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal, a Proposta De Emenda À Constituição Nº 65, DE 2012 (PEC 65/2012), sugerida pelo senador Acir Gurcacz (PDT-RO) presume que a apresentação de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) bastaria para que obras de infraestrutura não pudessem ser canceladas, descartando a exigência do licenciamento ambiental para sua realização.
A referida PEC 65/2012 acrescenta o § 7º ao art. 225 da Constituição, para assegurar a continuidade de obra pública após a concessão da licença ambiental. Neste § 7º profere: “a apresentação do estudo prévio de impacto ambiental importa autorização para a execução da obra, que não poderá ser suspensa ou cancelada pelas mesmas razões a não ser em face de fato superveniente”.
A PEC 65/2012 ganhou força no Senado Federal em setembro do ano passado como uma das propostas legislativas incluídas na Agenda Brasil (um conjunto de propostas voltadas à retomada do crescimento do país), encampada pelo presidente da Casa, o senador Renan Calheiros (PMDB/AL) com o objetivo de ampliar investimentos em infraestrutura. A PEC foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em abril deste ano tendo como relator o atual ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi (PR-MT).
Os parlamentares, em um documento de três páginas, justificam a proposta afirmando que as maiores dificuldades da Administração Pública, e, também um dos motivos para o seu desprestígio, consiste nas obras inacabadas ou nas obras que são interrompidas mediante decisão judicial de natureza cautelar ou liminar. Afirmam que a mudança tem por objetivo garantir a celeridade e a economia de recursos em obras públicas sujeitas ao licenciamento de sua execução após a concessão da licença. O Senador Acir Gurcacz (PDT/RO) em pronunciamento no Plenário do Senado afirmou que a PEC foi proposta com o objetivo de evitar a paralisação de obras públicas de infraestrutura após a concessão das licenças ambientais e defendeu que as questões ambientais que surgirem após o licenciamento podem ser resolvidas de forma administrativa.
É relevante mencionar também o que disse ao ‘Estado’ a coordenadora da 4º Câmara de meio ambiente e patrimônio cultural do Ministério Público Federal, Sandra Cureau, “Estamos perplexos com essa proposta. Se a simples apresentação de um EIA passa a ser suficiente para tocar uma obra, independentemente desse documento ser analisado e aprovado previamente, acaba-se com a legislação ambiental. É um flagrante desrespeito à Constituição, que se torna letra morta em tudo que diz a respeito ao meio ambiente.” Comentando ainda que “O Brasil é signatário de vários pactos internacionais de preservação do meio ambiente. A Constituição tem que ser harmônica, não contraditória em seus incisos”. Diferindo da opinião de Cureau, o senador Blairo Maggi, em sua análise, sustentou que a PEC “visa garantir segurança jurídica à execução das obras públicas”, quando sujeitas ao licenciamento ambiental. Segundo o mesmo “claramente se pode observar que a proposta não objetiva afastar a exigência do licenciamento ambiental ou da apresentação de um de seus principais instrumentos de avaliação de impacto, o EIA. Não afeta, assim, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e consagra princípios constitucionais da administração pública, como a eficiência e economicidade”. (Fontes: Estadão; Portal EBC)
HISTÓRICO DA AVALIAÇÃO DE IMPACTOS AMBIENTAIS
O principal marco histórico ambiental das Américas surgiu no Estados Unidos após a publicação do livro Silent Spring, da bióloga e pesquisadora Rachel Carson, que denunciava seriamente o uso abusivo dos agrotóxicos na agricultura e suas consequências sobre o meio ambiente e sobre a população. A publicação da obra causou grande mobilização social e ambiental no país, que resultou em uma lei Federal intitulada “National Environmental Policy Act of 1969”, conhecida pela sigla NEPA, que passou a vigorar em janeiro de 1970. Essa lei definia os princípios básicos da política ambiental norte-americana que regem todos os empreendimentos potencialmente impactantes. A NEPA identifica os impactos ambientais, sobretudo os negativos, e as propostas para o uso dos recursos naturais, além das medidas mitigadoras a serem adotadas em curto e longo prazo para a mitigação dos impactos negativos da atividade impactante.
As primeiras leis que tratam de impactos ambientais no Brasil seguiram a tendência da legislação norte-americana, sendo as mesmas elaboradas a partir da década de 1980, a exemplo da Lei nº 6.803 de julho de 1980, em seu art. 10, e da Lei nº 6.938 de agosto de 1981, que estabeleceu a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), na qual foi instituído para a sua execução o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) tendo o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) como órgão consultivo e deliberativo. Em 1986, para a regularização da Lei 6.938/81 (PNMA), foi promulgada a resolução n° 01/86 do CONAMA que estabelece as definições, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental.
LICENCIAMENTO AMBIENTAL
A exigência de licenciamento é fundamentada na Constituição Federal que, mesmo não trazendo expressamente o termo “licenciamento ambiental”, em seu artigo 225, trata que é dever do Poder Público exigir e dar publicidade ao estudo prévio de impacto ambiental. Isso possibilitou a utilização do licenciamento como forma de cumprimento do dever do Poder Público de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado.
O artigo 1º, inciso I, da Resolução Conama n° 237, de dezembro de 1997, traz o seguinte conceito de licenciamento ambiental: “Procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras; ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambienta, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicadas ao caso”. Em seu artigo 2º, a resolução versa que a licença ambiental é um ato administrativo do órgão competente que estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser seguidas durante as fases de localização, instalação, ampliação e operação do empreendimento ou atividade utilizadora de recurso ambiental consideradas efetivamente poluidoras ou com potencial de causar degradação ambiental.
A licença ambiental é, portanto, uma autorização, emitida pelo órgão público competente, concedida ao empreendedor para que exerça o seu direito à livre iniciativa, desde que atendidas as precauções requeridas.
Para cada etapa do processo de licenciamento ambiental, é necessária a licença adequada: no planejamento de um empreendimento ou de uma atividade, a licença prévia3 (LP); na construção da obra, a licença de instalação (LI) e, na operação ou funcionamento, a licença de operação (LO).
ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL (EIA)
         Para a implementação do Estudo de Impacto Ambiental foi estabelecido o conceito de impacto ambiental que, de acordo com a resolução CONAMA 01/86, entende-se como sendo “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente afetam a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e a qualidade dos recursos ambientais”.
O Estudo de Impacto Ambiental é um conjunto de estudos realizados por especialistas de diversas áreas, com dados técnicos detalhados, tornando–se condição necessária para “o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente”, como construção de estradas, usinas, indústrias, usinas de geração de eletricidade, aterros sanitários, portos, aeroportos, extração de combustível fóssil, extração de minério, exploração econômica de madeira ou lenha, entre outros. O EIA objetiva avaliar os impactos ambientais decorrentes da instalação de um empreendimento e estabelecer programas para monitoramento e mitigação desses impactos.
Conforme a Resolução Conama 01/86 o estudo de impacto ambiental desenvolverá, no mínimo, as seguintes atividades técnicas: diagnóstico ambiental da área de influência do projeto; análise dos impactos ambientais do projeto e de suas alternativas; definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos; definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos.
ANÁLISE DA PROPOSTA
A Resolução Conama nº 01/86, que rege a avaliação de impactos no Brasil, trata que o estudo de impacto ambiental (EIA), e seu respectivo relatório de impacto ambiental (RIMA), é exigência para o processo de licenciamento de empreendimentos que causam modificações no ambiente, contudo, apenas como parte do licenciamento e não como o requisito exclusivo para a liberação da licença.
A PEC 65/2012 visa assegurar a continuidade das obras públicas após a concessão da licença ambiental e demais exigências legais sem que haja qualquer interrupção da mesma por ato judicial. Entretanto, o texto do proposto parágrafo 7º do art. 225, ainda que bem justificado, apresenta informações vagas e pouco detalhadas em face da importância do assunto quanto aos dois principais temas abordados – a paralização da obra por ato judicial e a necessidade de licenciamento ambiental. O texto versa que apenas a apresentação do estudo prévio de impacto ambiental é suficiente para a autorização da execução da obra, porém sem falar acerca da necessidade do licenciamento ambiental para tal fim, o que deixa margem para interpretações diversas e até distorcidas quando se tratar da realidade do órgão ambiental competente e do realizador da obra quando esta vier a ser solicitada.
Tendo em vista o todo o histórico de conquistas e estudos que comprovam a importância do estudo de impactos ambientais a fim de preservar e conservar os recursos naturais cruciais para a vida em suas diversas formas, pode-se considerar um retrocesso na legislação ambiental brasileira em face da referida proposta de emenda. Ademais, vê-se que as demais leis que tratam do tema – que tiveram todo um histórico para serem criadas e já em vigor a tempos – deveriam ser revistas para poderem se adequar ao novo parágrafo da Constituição. Não se trata apenas de “celeridade e economia de recursos em obras públicas” trata-se do Meio Ambiente na sua forma mais ampla, trata-se da Vida.
TRAMITAÇÃO
A PEC foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em abril deste ano em meio à crise política, tendo como relator o atual ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi (PR-MT). Em maio, foi acatado requerimento do Senador Ranfolfe Rodrigues (Rede/AP) para que a proposta tramitasse junto com a PEC 153/2015. De volta à CCJ a proposta tem como relator o próprio senador Randolfe Rodrigues, já neste mês de junho. A mesma segue em tramitação nas pautas da CCJ, sendo que no último dia 16 a Comissão acatou ofício circular do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN); memorando da Câmara Municipal de Campinas, do Estado de São Paulo; ofício da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado de São Paulo; e ofício da Câmara Municipal de Novo Hamburgo, do Estado do Rio Grande do Sul, com manifestação contrárias à aprovação da Proposta.
A PEC tramita em regime especial que não necessita de sanção presidencial. A proposta precisa ser discutida e votada na Câmara o no Senado em dois turnos, com três quintos dos votos (60%) para ser aprovada em cada uma das casas. 

RELATED POSTS

0 comentários